Crise está a mudar os sistemas educativos
Educare | 29.07.13
Alunos adiam a entrada no mercado de trabalho por causa da recessão. Estados cortam nas despesas públicas com as escolas. Professores dos países mais afetados recebem menos salários. São os sinais da crise económica que, segundo a OCDE, está a provocar grandes mudanças nos sistemas educativos.
A crise económica fez disparar o aumento do desemprego jovem na maioria dos países europeus. Como resposta, os estudantes optam por continuar os estudos e ficar à espera de uma eventual recuperação. Entre 2008 e 2010 cresceu o número de alunos com idades dos 15 aos 19 anos que permanecia matriculado na escola. Estes e outros dados apresentados no relatório anual Education at a Glance – 2013, traçam um retrato do estado da educação nos 31 países membros e parceiros da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico).
No período de 2008 a 2011, o desemprego agravou-se. Grécia e Espanha foram os mais fustigados e apenas Chile e Alemanha registaram descidas. No entanto, uma coisa é certa: quanto maior é o nível de escolaridade, menos razões há para recear a perda de trabalho. Nos 21 países da União Europeia, o desemprego aumentou 5% entre os adultos que deixaram a escola sem completar o ensino secundário inferior (do 7.º ao 9.º ano) e superior (do 10.º ao 12.º ano). Nos Estados Unidos da América (EUA) o aumento foi de 6%. Menor subida registou-se entre os diplomados com cursos do ensino superior: 2% na Europa dos 21 e 2,6% nos EUA.
Alguns países, porém, parecem escapar ao flagelo. Mesmo sem o ensino secundário, as taxas de desemprego entre os 25 e os 34 anos baixaram 3,3% na Áustria, 2,1% na Alemanha e 1,0% no Luxemburgo. Boas notícias tendo em conta a subida registada em média na Europa dos 21: de 15% de desempregados em 2008 para 22% em 2011.
Dado igualmente preocupante para a OCDE é o crescente número de jovens que não estão empregados nem a estudar, entre 2008 e 2011. De novo a proporção varia de menos de 10% no Luxemburgo, Países Baixos, Eslovénia e Suécia a mais de 20% na Irlanda, Itália, Espanha e Reino Unido. Os maiores aumentos (mais de quatro pontos percentuais) ocorreram na Estónia, Grécia, Irlanda e Espanha.
Fruto da recessão, a despesa pública em instituições de ensino caiu em cerca de um terço dos países da OCDE, entre 2009 e 2010. Mas as estimativas mais recentes, para o período de 2010-2012, mostram que a queda acabaria por afetar os restantes. Em 2011 e 2012, o investimento em educação caía mais de 5% na Grécia, Hungria, Itália, Portugal e Reino Unido (País de Gales). Quedas muito menores (entre 1% e 5%) atingiam a Bélgica (Comunidade Francesa), a República Checa, Estónia, França, Irlanda, Polónia, Eslováquia, Eslovénia, Espanha e Reino Unido (Escócia).
Porém, o custo por aluno a frequentar o ensino primário (equivalente ao período que em Portugal vai do 1.º ao 6.º anos de escolaridade), secundário e pós-secundário não superior aumentou em quase todos os países da OCDE entre 2005 e 2010. Assim, em média, os países da Europa dos 21 gastaram 7200 euros anuais por aluno em 2010. Bem acima da média de 6.900 euros praticada na OCDE e abaixo dos 9600 euros gastos por aluno nos EUA. Em termos percentuais, a despesa por aluno sobe 18% nos 21, 17% no total de países da OCED e de 13% nos EUA.
Mas olhando para a Europa mais de perto, entre 2005 e 2010, a despesa por aluno a frequentar o ensino primário, secundário e pós-secundário não superior aumentou em 50% na Polónia e na República Eslovaca. Por outro lado, na Dinamarca e na França, os gastos nestes níveis de escolaridade aumentaram apenas 5% ou menos. Apenas a Hungria, Islândia e Itália apresentaram uma diminuição.
Com a exceção da Hungria, a existência de menos matrículas não foi a razão principal por trás das mudanças. Na verdade, na República Checa, Estónia, Polónia e República Eslovaca, a diminuição no número de matriculados de mais de 5% coincidiu com aumentos significativos (mais de 5%) nos gastos por aluno por instituições de ensino entre 2005 e 2010. Este dado “sugere que os governos deram prioridade à melhoria da qualidade da formação fornecida”, sublinha a OCDE. No Luxemburgo, Eslovénia e Suécia, uma queda semelhante no número de matrículas nesses níveis de ensino coincidiu apenas com um ligeiro aumento das despesas.
Os salários dos professores também aumentaram nos últimos dez anos, na maioria dos países. Em média, na Europa dos 21 (inclui todos os países da UE antes do entrada dos 10 países candidatos, a 1 maio de 2004, juntamente com a República Checa, Hungria, Polónia e Eslováquia), os salários dos professores aumentaram cerca de 20% em todos os níveis de ensino, nos Estados Unidos permaneceram iguais e só na França e no Japão diminuíram, em termos reais, quase 10%. Na República Checa, Estónia e Turquia, os salários de todos os níveis de escolaridade aumentaram em pelo menos 50%. No entanto, a pressão colocada pela crise nos orçamentos públicos veio quebrar esta tendência, sobretudo pelas restrições fiscais impostas. Em média, na Europa dos 21 em países com dados disponíveis, os salários dos professores diminuíram pela primeira vez desde 2000, em cerca de 4%, em termos reais, em todos os níveis de ensino entre 2009 e 2011.
Expansão do ensino superior
No ensino superior, os países da Europa dos 21 gastam, em média, 10 400 euros por cada aluno, enquanto o Japão gasta 13.000 euros e os Estados Unidos quase 21 000 euros. Ainda assim, um olhar mais aprofundado a cada país da zona euro mostra gastos na ordem dos 6.500 euros na República Checa, na Estónia e na República Eslovaca, e a ultrapassar os 15.000 euros na Suécia.
Os custos crescentes da expansão do ensino superior obrigaram os Governos a repartir com as famílias as despesas na sua educação. Desde 1995, uma série de reformas educativas culminaram na cobrança ou no aumento de propinas em 14 dos 25 países da OCDE, com informação disponível. Ainda assim, e com exceção da Islândia e da Eslováquia, o pagamento de propinas não se fez sem uma alteração do nível de apoio público à disposição dos estudantes.
Em 2009, foram introduzidas novas mudanças quer no pagamento de propinas quer nos sistemas de apoio público em vários países. Por exemplo, no Reino Unido, as propinas duplicaram ou triplicaram em algumas universidades em 2012 em virtude de um plano governamental para estabilizar as finanças destas instituições de ensino. Da mesma forma, em 2011, a Coreia implementou reformas para aumentar o nível de apoio público para o ensino superior. O objetivo: ampliar o acesso e melhorar a equidade.
Financiamento privado
Muitos países europeus tentam repartir os custos e os benefícios da educação superior equitativamente entre entidades públicas e privadas. Não é de estranhar que, neste cenário, a parcela de financiamento público para instituições de ensino superior tenha diminuído: de 77% em 1995, para 76% em 2000, para 71% em 2005 e, em seguida, para 68% em 2010, em média, entre os países da OCDE.
Esta tendência é influenciada, principalmente, pelos países não europeus, onde as propinas são geralmente superiores e as empresas participam de forma mais ativa na atribuição de subsídios para financiar instituições de ensino superior. Apesar do decréscimo, o financiamento público nos países europeus permanece oito pontos percentuais acima da média da OCDE.
Entre 2000 e 2010, a parcela de financiamento privado para o ensino superior aumentou em 20 dos 25 países para os quais existem dados comparáveis. Em média, essa proporção cresceu sete pontos percentuais e mais de nove pontos percentuais em Itália, México, Portugal, República Eslovaca e do Reino Unido. A parcela de financiamento privado também aumentou nos níveis primário, secundário, pós-secundário não superior, e em todos os níveis de ensino combinados, em média, entre os países da OCDE, mais significativamente na República Eslovaca e do Reino Unido.
Entre os países europeus para os quais existem dados disponíveis, só as instituições de ensino superior públicas em Itália, Países Baixos, República Eslovaca e do Reino Unido (governamentais, mas dependentes de instituições privadas) cobram propinas anuais de mais de 1.000 euros por aluno a estudar a tempo integral. Pelo contrário, as propinas são superiores a 1.200 euros em um terço dos países com dados disponíveis, e ultrapassam os 4000 euros, no Chile, Japão, Coreia do Sul e os Estados Unidos.
O relatório Olhares sobre a Educação – 2013 conclui ainda que os países gastam, em média, cerca de 20% dos seus orçamentos públicos para o ensino superior no apoio social às famílias e a outras entidades privadas. Mas os valores variam de menos de 10% na República Checa, França e Espanha para 68% no Reino Unido. O Japão dedica 29% do bolo total a estes apoios e os Estados Unidos 28%, em parte devido ao custo com as propinas ser mais elevado que nos países europeus.
Cortes nos salários atingem professores dos países em crise
Num clima de contenção económica, o relatório Education at a Glance – 2013 revela que os salários dos professores foram significativamente afetados na Estónia, Grécia, Hungria, Irlanda e Espanha. Na Estónia, os salários mínimos dos docentes baixaram aos níveis pagos em 2008 e 2009 e foram congelados desde essa data.
Na Grécia, as várias reduções de benefícios e subsídios afetaram os vencimentos de 2010 e 2011. Como resultado, os salários brutos caíram 17%, em termos reais, entre 2009 e 2011. Além disso, os professores gregos também viram os seus salários líquidos encolher devido à criação de um imposto de solidariedade. Este imposto aumentou o nível de tributação sobre o já reduzido salário bruto dos professores. Situação agravada pelo facto de um seguro pago pelos professores estar a ser calculado com base nos salários elevados, pagos anteriormente.
Na Hungria, o décimo terceiro mês de salário (um bónus suplementar pago a todos os funcionários) foi suspenso em 2009. O salário-base dos professores foi ainda afetado pela criação de um teto de limite ao pagamento de uma outra compensação auferida por todos os funcionários públicos.
Na Espanha, todos os salários dos funcionários públicos foram reduzidos em julho de 2010. A extensão da diminuição dependia do valor recebido anualmente, mas acabou por afetar tanto o salário-base como as gratificações auferidas.
Na Irlanda, os cortes nos vencimentos dos professores começaram em 1 de janeiro de 2010, como parte de um amplo programa público de redução nas remunerações. Além disso, os professores que entraram na profissão após 1 de janeiro de 2011 são agora pagos de acordo com uma tabela salarial 10% abaixo da que era aplicada aos contratados antes dessa data.